qui. nov 21st, 2024

Pandemia aproximou profissionais, pacientes e familiares; com equipes multidisciplinares e realidades diferentes, médicos guardam histórias de superação

Intenso, segundo o dicionário, é aquele que se manifesta com uma força excessiva, que ultrapassa o esperado. Assim é o trabalho dentro de uma unidade de terapia intensiva, onde a tensão e o cuidado são constantes e tudo é feito em conjunto, desde o simples “virar o paciente” até a discussão dos procedimentos adotados, que cada vez envolve mais profissionais de diferentes áreas – médico, fisioterapeuta, fonoaudiólogo, psicólogo.

Protagonista no cuidado da pandemia da covid-19, o que não faltam nas UTIs são histórias para contar. Especialista desde 2014 na área, o médico intensivista Jarbas da Silva Motta Junior era o responsável pela coordenação da UTI covid-19 do Hospital Marcelino Champagnat, em Curitiba (PR), e foi o primeiro a receber um paciente grave da doença no Paraná.

Ele escolheu a especialidade porque viu nela uma oportunidade de salvar pessoas, mas jamais imaginou que viveria dias tão intensos como foram os últimos dois anos. “As pessoas chegavam muito mais graves do que de costume, tudo era novo, a gente ainda estava descobrindo como a doença se manifestava e as melhores formas de cuidado. A pandemia nos aproximou das famílias dos pacientes, por diversas vezes nos colocou no lugar deles e nos fez comemorar junto cada alta hospitalar”, conta.

Dar alta após 101 dias de internação na UTI, acompanhar a recuperação de pessoas submetidas à ECMO, que funciona como um pulmão artificial, após dois dias sem sair do lado do paciente, as incertezas e dores de ver o pai internado em um dos leitos são fatos e sentimentos que ficarão para sempre na memória do médico. “Todos os pacientes nos marcam de alguma forma, além do que, a covid nos trouxe desafios novos. Por muitas vezes, preparamos a família para um desfecho não favorável e eles nos surpreendiam com a reação. É essa possibilidade de falar para uma família sem esperança que o parente está voltando para casa que me atraiu na medicina intensiva”, complementa.

Redescobrindo as origens na pandemia

Já o intensivista e hoje coordenador das áreas de internação dos hospitais Marcelino Champagnat e Universitário Cajuru, José Arthur Brasil, tem 12 anos de experiência e na pandemia da covid-19 largou tudo e foi reforçar o quadro de profissionais da saúde de Manaus (AM). Trabalhou no Hospital Delphina Aziz, que já sofria com déficit de leitos antes da crise sanitária.

Sob sua coordenação, ajudou na abertura de uma UTI de 120 leitos, “tanto na parte estrutural quanto no treinamento das equipes”, reforça. “Eu nasci no Acre e senti que tinha uma dívida com a região onde cresci e que me ensinou a dar os primeiros passos na Medicina. Chegamos a 80 leitos sob minha coordenação direta. Foi um período de muito trabalho, tensões e aprendizados que ficaram marcados”, relembra.

Segundo Brasil, que tem o sobrenome mais que apropriado para o cargo que exerceu diante da escassez de recursos, a missão era prestar o melhor atendimento possível com os materiais e medicamentos disponíveis. A proximidade com os pacientes e suas famílias também foi algo que deixou de ser exceção para se tornar regra.

“Nas unidades de terapia intensiva, é normal que haja certo distanciamento entre paciente, família e equipes de cuidados. Nos momentos mais críticos da covid-19, nós, médicos, assim como a equipe multiprofissional, assumimos a missão de levar e trazer informações aos pacientes e familiares, além de encontrarmos formas de aproximar as pessoas em um momento tão dramático. Era nítida a mudança de semblante de um paciente há dias internado, com desconforto respiratório, ao receber notícias de seus amigos, áudios da família, fotos dos animais de estimação”, recorda.

“Olhando para trás, a experiência foi incrível e confesso que faria tudo novamente sem pensar duas vezes”, afirma. “O médico intensivista tem na sua formação um olhar para a totalidade do paciente e seus familiares. Lidamos com pessoas em situações de muita vulnerabilidade, em sofrimento físico e emocional. Nossa missão é envolver toda a equipe nesse olhar muito abrangente e complexo sem deixar de ter empatia e colocar o paciente e sua família no centro do cuidado”, finaliza.